
Flamengo, Fluminense, Internacional e Fortaleza participaram de um importante painel sobre fair play financeiro, realizado nesta sexta-feira, nas Laranjeiras. O debate integrou o II Simpósio de Direito Esportivo e girou em torno de uma pauta cada vez mais urgente no futebol brasileiro: o combate aos clubes inadimplentes.
A proposta central apresentada no encontro ganhou força. A ideia é simples e direta: clube que não paga, não joga. Para o presidente do Fluminense, Mário Bittencourt, bastaria que a equipe credora notificasse por e-mail a inadimplência, e o adversário estaria automaticamente fora da rodada. A medida eliminaria distorções competitivas e traria efeito imediato ao mercado.
Proposta recebeu apoio de Bap e outros dirigentes
A sugestão de Mário agradou os demais presentes. Marcelo Paz (Fortaleza), Alessandro Barcellos (Internacional) e Bap, presidente do Flamengo, demonstraram apoio à medida. Bap, inclusive, foi além: defendeu que, com o tempo, clubes que não honrarem compromissos também sofram punições esportivas, como perda de pontos.
— Sugestão do Mário é boa, simples, fácil e rápida de implementar. Mas entendo que com o tempo deva haver punições esportivas de perda de pontos. Tem SAFs, clubes de tamanhos diferentes… […] “Ah, mas clube virando SAF vai pagar tudo”. Tem clubes reconhecidamente fortes hoje em dia que viraram SAF e não pagam ninguém. Onde não houver sanção, não acredito que haverá solução, pelo menos nesse aspecto — afirmou Bap.
O dirigente rubro-negro foi o primeiro a citar as Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs), alertando que o modelo, por si só, não garante boas práticas financeiras. Para ele, muitos “donos” seguem priorizando outras frentes e empurrando dívidas para o fim da fila.
Corinthians citado como exemplo de desequilíbrio
Durante o painel, o nome do Corinthians apareceu duas vezes como símbolo de distorção no mercado. Primeiro, ao lembrar a eliminação do Fortaleza em mata-mata contra o clube paulista, mesmo estando em dia com suas obrigações. Depois, ao destacar a disparidade de investimentos na janela de meio de ano de 2024. Enquanto lutava contra o rebaixamento, o time alvinegro contratou pesado, se classificou para a Libertadores, mas não honrou os compromissos assinados.
Esse tipo de cenário, segundo os presentes, desestimula quem cumpre com as regras e favorece quem gasta mais do que pode.
Internacional tem dívida com o Flamengo
A ironia do debate é que, apesar da participação ativa no simpósio, o Internacional carrega uma dívida com o Flamengo envolvendo a contratação de Thiago Maia, em 2024. Sem conseguir quitar as parcelas acertadas, o clube gaúcho tentou repassar a obrigação ao Santos, numa tentativa de triangulação vetada pelo Rubro-Negro, que passou a exigir garantias financeiras em toda negociação nacional.
Apesar disso, Alessandro Barcellos buscou manter o tom institucional e defendeu que o futebol brasileiro precisa encarar suas diferenças financeiras com maturidade.
— Nós não temos diferença de pensamento sobre o futebol brasileiro. Temos circunstâncias. O Internacional de hoje pode ter sido o Flamengo de ontem. O Fla de hoje pode ser o Inter de amanhã. Em relação aos aspectos financeiros. O que precisamos é pensar soluções que elevem o futebol brasileiro a outro patamar. Isso só será possível se a gente considerar as diferenças de governança, políticas, e financeiras — afirmou o presidente colorado.
Quem deve controlar o fair play financeiro?
Uma das questões centrais do encontro foi sobre quem teria legitimidade para controlar o fair play financeiro no país. Alessandro Barcellos questionou a atuação da CBF, especialmente diante da crise institucional da entidade, agravada pela recente saída de Ednaldo Rodrigues.
— Vamos montar um fair play financeiro, mas precisa ter um controlador. Vai ser essa CBF que está aí? A CBF ou será quem? Nós vamos ter capacidade de construir uma liga que terá instrumentos para controlar o fair play financeiro? — questionou Barcellos.
Marcelo Paz, CEO do Fortaleza, reforçou que a CNRD (Câmara Nacional de Resolução de Disputas), já existente na estrutura da CBF, precisa ganhar mais eficiência e independência para agir.
— Entendo também que a CNRD, que já existe, está legitimado, dentro da CBF, tem que ser mais rápida, efetiva e menos política. Como o transfer ban da Fifa, mas só vale para transações internacionais. A CNRD ainda é muito lenta, tem interferência política, demora a julgar, a avaliar… Penaliza quem cumpre com seus compromissos e facilita para quem não cumpre — analisou Paz.
Fla pressiona por garantias e cobra responsabilidade
Na prática, o Flamengo já mudou sua postura e exige garantias financeiras concretas para fechar qualquer operação com clubes brasileiros. O caso Thiago Maia foi um divisor de águas e agora serve de alerta para o mercado: quem quiser negociar com o Rubro-Negro precisa mostrar capacidade de pagamento.
Com o debate ganhando corpo entre os principais clubes do país, a expectativa é de que esse movimento se transforme em ações práticas nas próximas reuniões da Liga Forte União e da Libra. A torcida rubro-negra, claro, espera que a justiça prevaleça dentro e fora de campo — e que os bons pagadores deixem de ser penalizados por aqueles que jogam fora das regras.