
Flamengo voltou a se posicionar como protagonista na discussão sobre fair play financeiro no futebol brasileiro. Um dos maiores defensores da ideia é o atual presidente do clube, Rodolfo Landim (Bap), que participou na última sexta-feira (17) do II Simpósio de Direito Esportivo, realizado nas Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Mesmo no dia do aniversário do filho, Bap fez questão de estar presente para defender o tema, considerado crucial para o futuro do futebol nacional.
Durante o evento, que também contou com os presidentes de Fluminense e Internacional, além do CEO do Fortaleza, o mandatário rubro-negro foi a única voz representante da Libra no meio de dirigentes da Liga Forte União (LFU). Bap expôs ideias firmes sobre controle de gastos, punições esportivas e a responsabilidade do ecossistema.
Limite de gastos: “75% já é muito”
Bap iniciou sua participação destacando as diferenças estruturais entre os clubes e questionou a lógica de que o Flamengo pode gastar ilimitadamente por arrecadar mais. Segundo ele, o clube da Gávea carrega responsabilidades que outros não têm.
“Tem SAFs, clubes de tamanhos diferentes… Muita gente fala que o Flamengo é um clube rico. Mas é como se fosse um pai com 11 filhos, um deu muito certo, mas os outros 10 dependem dele e do pai. Nós temos muitos esportes dentro da casa que custam. Outros clubes não têm. Por mais que digam que você pode gastar 100% do que arrecada no futebol, eu não consigo fazer. Por mais que a lei permita. Acho que no Brasil você colocar um limite para gastar com futebol, 75% só com futebol já é bastante coisa. Acho que isso poderia ajudar.”
Com esse argumento, ele defendeu um teto que leve em conta as realidades diferentes entre clubes, ainda que reconheça as dificuldades de se estabelecer um critério único.
Punições esportivas: “Tem que ser pela dor”
Ao apoiar a proposta do presidente do Fluminense, Mário Bittencourt, de que “quem não paga, não joga”, Bap foi além e sugeriu punições esportivas mais duras, como a perda de pontos.
“Sugestão do Mário é boa, simples, fácil e rápida de implementar. Mas entendo que com o tempo deva haver punições esportivas de perda de pontos. Tem clubes reconhecidamente fortes hoje em dia que viraram SAF e não pagam ninguém. Onde não houver sanção, não acredito que haverá solução. Pelo amor não vamos mudar esse aspecto, tem que ser pela dor.”
Para o presidente rubro-negro, só medidas concretas podem transformar a cultura permissiva que ainda impera em boa parte do futebol nacional.
Dirigente inadimplente? Inelegível
Outro ponto levantado por Bap foi a responsabilização direta de quem comanda os clubes. Ele defende que dirigentes que deixam dívidas não possam mais concorrer a cargos.
“Uma coisa que funcionaria é punir os dirigentes. Se está devendo, está inelegível nos seus clubes. Logo que ganhei as eleições, cara chegou para mim e disse: ‘Sabe que se parar de pagar impostos você contrata dois Alcaraz por ano aqui no Flamengo?’ A gente ganha tudo e lá na frente vê como ajusta isso. Estou dividindo isso com vocês. Acho que tem um aspecto cultural, que com jeitinho resolve tudo, e isso é ruim.”
A crítica toca num ponto sensível: o incentivo à irresponsabilidade por parte de quem deveria dar o exemplo.
Prazo de adaptação e aplicação gradual
Mesmo sendo a favor da rigidez, Bap não ignora que mudanças estruturais exigem tempo. Por isso, ele propôs um modelo de aplicação progressiva para que os clubes consigam se adequar.
“E precisa ter um período para os clubes se adequarem. ‘Ah, cinco anos é muito tempo’. Nada em um clube de futebol é tão simples de ser mudado. ‘Esse ano não tem punição esportiva, mas ano que vem perde tantos pontos, não pode comprar jogador’… Tem que ter uma gradação para permitir que os clubes se programem.”
Imagem do futebol brasileiro afasta investidores
Por fim, o dirigente reforçou o quanto a imagem ruim do futebol brasileiro tem afastado grandes empresas, mesmo em um mercado com imenso potencial.
“Sei que algumas mazelas do nosso futebol afastam empresas que têm um caminhão de dinheiro para colocar no nosso negócio. Eles dizem: ‘Parabéns, você foi campeão, mas esse ano estamos com uma readequação orçamentária’. Às vezes a conversa interna é: ‘Não bota dinheiro nesse troço porque é um bando de picaretas, não tem regra em p… nenhuma e vamos ter nossa imagem manchada’. Então nós temos responsabilidade em relação ao ecossistema. O Flamengo paga tudo, mas joga com clube que não paga, o ecossistema está contaminado.”
Para Bap, é preciso transformar a credibilidade do futebol brasileiro num ativo concreto. E o fair play financeiro, segundo ele, é o primeiro passo para limpar a imagem, garantir justiça esportiva e atrair o investimento que o mercado merece.